O que você pensaria de uma pessoa que diz frases como estas:
“A televisão foi a maior tragedia já inventada pela humanidade!”
“Crianças não tem que pensar logicamente ou ter senso crítico porque senso crítico é enxergar o lado negativo das coisas e elas não precisam disso, ainda.”
“Expor uma criança à Internet é como deixá-la em um cruzamento de duas avenidas movimentadas.”
Quase todo mundo dirá que é de um conservadorismo extremo, que é mais um indivíduo maluco, de “pensamento radical”.
São frases do professor Valdemar Setzer, pensador radical assumido(porque a “educação é radical”, diz ele).
Antes de qualquer julgamento, vale lembrar que Setzer é, no mínimo, exemplo de integridade intelectual. Ele pensa, fale e age da mesma forma, e faz isso há décadas, sem defender interesses de nenhum partido, igreja ou corporação, a não ser suas próprias ideias respaldadas por centenas de pesquisas de autores de diversas áreas, incluindo psicologia e medicina (experimente conferir a quantidade de referências que ele usa em suas apresentações e artigos).
Setzer participou como entrevistado de programas como Roda-Viva, Provocações (com Antonio Abujanra, quase se pegaram) e muitos outros na TV, radio e Internet, sempre disseminando ideias que provocam e fazem pensar. É muito divertido assistir debates em congressos de educação quando há presença do professor Setzer, recomendo, ele desequilibra o que todos querem falar e ouvir, com bom senso e originalidade. Ao final, as pessoas se chocam mas algumas concordam com ele.
Penso que Setzer deveria ser um grande inspirador para quem trabalha com educação e tecnologia porque, no fundo, está preocupado com as pessoas. Para ele, as pessoas não são o problema, a tecnologia é que é o problema.
O otimismo tecnológico só faz sentido em educação, se for crítico.
O arcabouço das ideias de Setzer está ligado à Pedagogia Waldorf, visão derivada das ideias do filósofo austríaco, criador da Antroposofia, Rudolf Steiner (1861-1925). Segundo essa visão, a formação das pessoas deve primar pela integração do espírito e do intelecto, o que é atingido por meio das artes, do convívio e da natureza. Cada faixa etária (setênios, na verdade) tem suas particularidades, a formação de cada indivíduo tem que ser cultivada como uma planta: exige atenção, cuidado, tempo e proteção. Pressa e consumismo não cabem na Pedagogia Waldorf, assim como raciocínio formal ou imagens em movimento, por isso a tecnologia digital é inimaginável em escolas desta linha pedagógica.
A Escola Aldeia Akatuem Campinas segue a filosofia de educação Waldorf e ali assisti recentemente a uma palestra do professor Setzer, o que me leva a este registro.
Evidentemente, muitos pensam que a pedagogia Waldorf só forma artistas ou que os alunos egressos de escolas Waldorf terão muitas dificuldades no vestibular. Nada disso é verdade. Ver [2].
Embora Setzer diga que não há meio termo em tecnologia, acostumei-me a filtrar as ideias dele e a aprender com a forma dele pensar, nem sempre concordando com elas – sempre foi útil para mim e pode ser para outras pessoas. Há muito o que se fazer com educação e tecnologia, senso crítico é a base de tudo.
Encerro aqui com a última frase dita por ele, ao final do encontro:
“Não acredito mais na massa da humanidade, a massa da humanidade está perdida. Eu acredito nos indivíduos… na ação de cada indivíduo.”. V. Setzer
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[1] https://www.youtube.com/watch?v=HpQrnrpSECs
[2] https://waldorfonline.com.br/blog-waldorf/7-Mitos-sobre-Ex-alunos-Waldorf/105
[3] As ideias de Setzer estão em dezenas de artigos no endereço: https://www.ime.usp.br/~vwsetzer/