
Cada epidemia tem sua própria narrativa de terror. Em um dos livros de Drauzio Varella, ele narra a infância no bairro do Brás em Sao Paulo e conta que na época da gripe espanhola os cadáveres eram recolhidos na ruas e colocados em carrocinhas, uns sobre os outros. A imagem remete a gravuras da peste negra na Idade Média.
Nas gravuras medievais não aparecem gatos e não é à toa. Uma das teorias associadas às causas da peste negra tem ligação com extermínio de gatos devido a crendices religiosas. Cidades sem saneamento ou higiene e com ratos livres de predadores fizeram com que a febre dizimasse quase um terço da população da Europa (ver [1]).
Confusão eterna entre tecnologia e tecnologia digital
Vi pessoas ligadas à educação dizerem recentemente em uma live que não havia tecnologia cem anos atrás na época da gripe espanhola e que hoje temos “a tecnologia”. por isso o problema da pandemia será resolvido em breve com uma vacina eficaz.
Há uma grande incompreensão entre tecnologia e tecnologia digital. Havia tecnologia cem anos atrás assim como havia tecnologia há milhares de anos atrás quando nos tornamos a única espécie humana no planeta. E foi a tecnologia que nos permitiu chegar até aqui, controlando o fogo, por exemplo.
Conhecimento é como uma bexiga que separa o que você sabe do que você não sabe. Se você enche assoprando ar-conhecimento dentro dela, armazena mais conhecimento no interior mas a área externa passa a ser maior: percebe que quanto mais sabe, proporcionalmente sabe menos.
Bill Gates previu a pandemia e a insuficiência de recursos pra enfrentá-la
Bill Gates disse em 2015 que se avizinhava uma grande epidemia e que a humanidade não estava preparada para enfrentá-la. Foi em uma palestra TED (ver [2]), aquelas palestras espetaculares em que ninguém faz perguntas e o expositor fala por cerca de quinze minutos um assunto impactante. Em geral é um palestra-bomba com muita informação condensada, feita para iluminar um assunto e “causar” nas pessoas. Parece que a de Bill Gates não “causou”.
Na palestra TED ele insistiu na necessidade de união de esforços e de investimentos dos governos em programas de saúde nacionais, entre outros pontos.
Nos Estados Unidos, de 2015 para cá os investimentos no sistema de saúde caíram. Gates percebeu que a humanidade vai acabar se não se ajudar e há coerência no discurso. Desde que deixou a Microsoft, tem uma fundação que busca saídas inovadoras para alguns dos principais problemas que afligem a humanidade: falta de água, de saneamento básico, de vacinas.
Os microzumbis que derrotaram toda a tecnologia hoje disponível
Vírus não são exatamente seres vivos porque não se alimentam e não respiram. Se aprendemos na escola que a célula é a unidade da vida e os vírus não possuem células, então não estão exatamente vivos. Estes microzumbis, em analogia a um computador, seriam menos do que um bit.
Se os vírus estão mortos mas andam por aí e se multiplicam alimentando-se do que está vivo e por perto, os vírus são microzumbis.
Alguém duvida que estão estão dando um verdadeiro baile em toda tecnologia que temos disponível hoje em dia? O país mais tecnológico do mundo já contabiliza mais 5 milhões de casos de contaminação e 170 mil mortos, número que supera em mais de três vezes o número de mortos na Guerra do Vietnã.
E no mundo todo o número de mortos em razão do coronavírus vai bater um milhão nas próximas semanas.
Bill Gates deu o recado em 2015 e insistiu que precisávamos nos preparar. O grande xamã da tecnologia pregou modéstia e união. Diferente dos que dizem que tudo vai se resolver em breve porque afinal “hoje temos tecnologia”.
Não estávamos prontos para essa epidemia e ao que tudo indica não estaremos prontos para a próxima também.
Se a tua espécie continuar, bate as mãos!
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